entrevista
Uma entrevista com a autora, a partir de perguntas que costumam ser feitas.
Você pensava em ser escritora, quando era criança, no interior de Minas Gerais?
Quando criança, eu brincava de ser professora. Dava aulas para irmãos e vizinhos, e quando não havia público, as pedras eram minhas alunas. Sim, enfileirava ou fazia rodas com pedras e atuava como professora. Comecei a ler em casa, antes da escola, manuseando jornais e revistas. Nunca pensei em ser escritora, não conhecia autoras que publicaram livros. Ah, e pensava em ser médica, cuidar das pessoas, escutá-las.
Como nascem as ideias dos seus livros?
As ideias nascem da vida, das coisas que vivo, escuto, sinto, vejo. Pode ser uma palavra, uma imagem, um sonho, uma alegria, uma raiva, uma foto, um objeto. Aquilo que me convoca para ser escrito. É como um chamamento, sabe?
Você escolhe temas para escrever?
Os temas me escolhem. Costumo escrever sobre desamparo, solidão, amizade, solidariedade, perda… Ou seja, a vida na sua potência de coisas boas e também de coisas nem sempre boas.
Quando um tema vem de fora, tenho certa dificuldade para escrever. Preciso me sentir engajada com a escrita. Não planejo o que vou escrever, os temas chegam.
Como começa uma história ou um poema?
Começa com uma cutucada que recebo de uma palavra, de uma lembrança. Aquilo volta ou insiste dentro de mim, como uma provocação ou incômodo. Aí anoto umas palavras. Nasce um título que pode ser uma palavra. Se passar o tempo e eu for mexendo e tendo mais desejo de burilar a escrita, ela se torna um texto de pé. Ou seja, uma escrita que eu gostaria de compartilhar com as pessoas. Há textos que ficam como sementes, não ficam de pé, isto é, não seguem adiante. Ficam guardados nas gavetas ou perdidos no computador. Com o passar do tempo, me desfaço deles.
Você escolhe seus ilustradores?
Poucas vezes escolhi ilustradores. Essa função é da editora. Quando posso sugerir nomes por afinidade, faço isso. Já tive excelentes parcerias, por exemplo, com o André Neves que ilustrou mais de um livro meu. O mais usual é a editora escolher quem vai ilustrar.
Você ilustra livros?
Eu escrevo. Não ilustro nem desenho. Gosto de fotografar. E, a partir de fotos, escrever. O livro Histórias d’além mar foi ilustrado (por André Neves) a partir de fotografias que fiz em viagens a Portugal.
O que você gostaria de dizer aos seus leitores?
Gratidão por fazer existir o texto que escrevi. Um conto ou poema tem vida se for lido por leitores. O livro publicado parado na estante não é vivo. Ele precisa ser manuseado e lido por alguém.
O que te levou a escrever para crianças?
Desde que comecei a escrever, gostava desse exercício com a palavra: o escreve-apaga-rabisca-reescreve. É como se eu me passasse a limpo, renascesse, a cada escrita. Estudei Letras e, na faculdade, tive contato com a literatura infantil e juvenil que eu conhecia pouco. Me apaixonei, gosto de trabalhar com as infâncias, os brinquedos, a ficção. Isso me conecta com a minha origem e com a possibilidade de brincar com as palavras e os pensamentos.
Você tem rotina de trabalho com a escrita?
Tenho rotina nos compromissos como professora e psicanalista. Zero rotina com a escrita. Escrevo muito quando estou fora de casa, em outra cidade. Com o distanciamento, me volto para dentro dos textos, de mim. Cada vez mais, quero me dedicar às leituras e às escritas.
Como é ser escritora, professora e psicanalista?
Gosto das minhas atuações diferentes porque conversam com as palavras e os sentimentos. São ocupações dos encontros, das ausências, das mudanças. Acredito nesse encontro (palavra/afeto) que vivo ao exercer meus trabalhos.
Qual foi o seu primeiro livro publicado?
Foram dois livros no mesmo ano de 2006: Com a Maré e o Sonho e A Velha dos Cocos. Ambos trazem situações com os cocos, mas diferentes. Com a Maré e o Sonho mostra as descobertas de uma menina diante de um coco, seus sonhos e curiosidades. A Velha dos Cocos traz uma aposta na mudança de vida da personagem. Só que ela perde o saco de cocos, e agora
Tem algum livro que você gosta mais?
Não consigo escolher. Geralmente, estou muito ligada ao livro mais recentemente publicado.
Qual o livro mais difícil que você já escreveu? E o mais fácil?
As histórias em capítulos ou coletâneas de contos demandam tempo para releituras e reescritas. São as que me deram mais trabalho: Com Fio; Histórias D’além Mar; Coisas que viram Outras.
Alguma história que você escreveu já aconteceu de verdade?
Tudo que escrevo vem da realidade e da fantasia. Bem misturado, a ponto de eu mesma não saber identificar se sonhei o que escrevi. Ou se escrevi depois que sonhei. A ficção é uma roupagem que veste o texto.
Você se corresponde com os leitores?
Vez ou outra, recebo uma mensagem de e-mail ou no inbox do Instagram ou do Facebook de algum leitor. Gosto de me deparar com olhares diferentes sobre o que escrevi.
Quais seus autores e livros preferidos para leitura?
Leio poesia, romances, contos, crônicas, biografias, ensaios (sobre literatura, psicanálise, gastronomia, viagens, meio ambiente, artes). Tenho um gosto bem eclético para leituras. Gosto de obras de autora/es que me envolvem tanto na ficção que acredito no universo do contexto da leitura. Bartolomeu Campos de Queirós, Lygia Bojunga, Marina Colasanti, Ziraldo, Joel Rufino dos Santos, Ruth Rocha, Sylvia Orthof e Ana Maria Machado são autores clássicos da literatura infantil e juvenil que leio e releio sempre. As obras dessa geração me formaram como leitora e como escritora.
Da literatura contemporânea, tenho gostado muito das obras de Elena Ferrante e Domenico Starnone, dois autores de Nápoles. Por quê? Porque transitam pelos conflitos com naturalidade e me mergulho de cabeça nos dramas. Sofro e me divirto.
Como você escolhe o título dos seus livros?
O que nasce primeiro em cada escrita, em cada livro, é o título. Preciso de um título para escrever, é como um farol me iluminando. Acontece de eu mudar o título depois. Não sei escrever prosa sem um título.
Escrita em prosa ou em poesia: o que você prefere?
Gosto de escrever as duas. Confesso que antes da prosa, sinto falta de uns versos, de epígrafes, aquilo em versos que vem antes de começar um parágrafo.
Você tem livros polêmicos? Como o público reage?
Como tenho personagens em situações limite de pobreza, de loucura, de solidão, alguns adultos questionam se seriam obras para crianças. Sim, são obras para as infâncias de todas as idades! Minhas histórias não terminam em um clima pessimista (por exemplo: Donana e Titonho; O Menino no Beco da Pipa; Mergulho no Espelho). Algumas trazem um final em aberto, a ser preenchido pelo leitor. Outras terminam sem promessas forçadas, próximas à realidade. Se uma criança perdeu a mãe, não há volta. Há, sim, a possibilidade de substituição ou deslocamento do sentimento amoroso para outra pessoa ou coisa.
Quais são as coisas de que você mais gosta?
Gosto de natureza, mata, mar, caminhadas, bichos nos lugares naturais deles. Gosto de ler, escrever, pesquisar, cozinhar, arrumar a casa, limpar a cozinha, cuidar de plantas, viajar, dançar, nadar, remendar roupas e dar nova vida a coisas velhas e esquecidas. Muita coisa, né?! Adoro a vida.